terça-feira, 4 de março de 2008

Artigo

Coloco aqui o artigo que escrevi para o Jovem Socialista, periódico da Juventude Socialista. Ontem saiu a ediçao em papel, brevemente estará disponível a ediçao online no sítio da Internet da Juventude Socialista. Partes importantes do artigo estao baseadas em post anterior.

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Agradeço à JS, ao PS e ao PSOE a oportunidade de fazer campanha no grupo “Jovens Europeus com Zapatero”.

Dia 9 de Março, a liberdade vai a votos
por David Erlich

Numa iniciativa levada a cabo pelo PSOE - "Jovens Europeus com Zapatero" - David Erlich está em Madrid para dar o seu contributo ao PSOE na recandidatura de José Luis Rodríguez Zapatero. Acompanha o dia a dia deste Jovem Militante da JS através do “diário” de Campanha em: www.o-dia-z.blogspot.com

Sou filho de imigrantes. Os meus pais fugiram da ditadura militar argentina em 76, encontrando em Portugal, onde estabeleceram família, a recém-nascida liberdade. Nesse sentido, sinto-me filho de Abril. Se o Estado Novo tivesse durado mais 2 anos, eu não seria quem sou, não seria português. Sou filho de Lidia Elsa David de Erlich Oliva e de Alejandro Erlich Oliva. Mas na minha genealogia entra também o 25 de Abril de 1974. A liberdade não é apenas um valor que me guia e que defendo – ela foi circunstância essencial do meu próprio nascimento.
Rejeito a noção de que a liberdade é apenas a igualdade legal/formal entre os cidadãos. A igualdade de oportunidades real, material, quotidiana, é também indissociável da liberdade. É essencial o reforço de um Estado que, não querendo comandar a vida de ninguém, ajude os desfavorecidos a poder comandar os destinos da sua própria vida. Zapatero, nomeadamente, aumentou o salário mínimo de 450€ para 600€; criou a licença de paternidade; atribuiu 2500€ por nascimento, 3500€ em famílias específicas; duplicou o investimento educativo; os cidadãos pobres isentos de IRS passaram de 5,3 milhões a 7; e o desemprego baixou de 11,06 para 7,95%.
No âmbito desta liberdade sentida na pele, abordarei a xenofobia do PP espanhol e, sucintamente, a legalização de Zapatero do casamento homossexual.
É incorrecto abordar as diferenças entre o Estado Social de Espanha e o de Portugal do ponto de vista de uma avaliação diferenciada da sensibilidade social dos respectivos governantes, já que ambos países possuem realidades económicas muito díspares. Mas no que diz respeito ao casamento homossexual – área sem custos para o Estado e que constitui um avanço em termos da igualdade de oportunidades entre orientações sexuais diferentes – nota-se a diferença entre um Governo PSOE moderno e pluralista, num contexto de polémica temática igual à portuguesa, e um Governo PS conservador nesta área e com falta de coragem política.
É com o prazer de quem acredita na multiculturalidade que vejo como mais que provável futuro presidente dos EUA um filho de pai queniano, cuja avó vive ainda numa cabana. A imigração ilegal deve ser combatida sobretudo nas suas raízes, como fez Zapatero ao duplicar a ajuda ao desenvolvimento dos países mais pobres, porque não favorece ninguém, a não ser os patrões exploradores. Porém, Rajoy critica ferozmente o aumento do número de imigrantes legais. Que pensarão essas pessoas (?), que trabalham, pagam impostos, têm filhos (?), que fogem de dramas, perante os quais os países desenvolvidos costumam fechar os olhos e recolher os braços, na procura instintiva de uma vida digna (?), que pensaria o meu avô que fugiu do totalitarismo soviético para a Argentina, à procura de fazer música livre – a sua arte – e não uma guerra de causas distorcidas (?), que pensariam eles, pessoas que Rajoy julga não pelo seu mérito mas por algo tão aleatório como o local de nascimento?
Rajoy identifica como causa do seu pensamento xenófobo aquilo que na realidade é uma consequência da materialização política do mesmo: 34 % dos reclusos das prisões espanholas são estrangeiros (a percentagem populacional de imigrantes é muito menor), pelo que, segundo o PP, perigo e imigração andam de mãos dadas. Ora, se uma vez que entram, o Governo do país receptor segrega, difama e não auxilia os imigrantes, é natural que a criminalidade entre os mesmos cresça, tal como aconteceria com os cidadãos nacionais do país receptor, se fossem submetidos a semelhantes condições de pobreza e isolamento. Os imigrantes não são um problema social – os imigrantes sofrem problemas sociais.
Neste sentido, é de frisar que o Governo de Zapatero aumentou em 720% o financiamento à integração dos imigrantes e que o Governo de Sócrates, com a nova Lei da Nacionalidade do PS, aumentou em 900% o número de naturalizações em 2007 relativamente aos dez anos anteriores somados. Assim se caminha rumo ao pluralismo, à justiça, à liberdade de cada um ter, cada vez mais, oportunidade de perseguir o seu sonho.
No "contrato de integração" que Rajoy propôs, a celebrar entre os imigrantes e o Governo espanhol, há uma proposta de que o imigrante se comprometa "a respeitar os costumes espanhóis". Qual a fronteira entre o respeito e o desrespeito? O emigrante português ouvir fado – será desrespeito? Não festejar o Natal, falar em crioulo – será desrespeito? E, aliás, o que são "os costumes espanhóis", ou os costumes de qualquer outra sociedade pós-industrial? O que têm em comum os hábitos de um "português genuíno" de 30 anos morador em Lisboa e os hábitos de um "português genuíno" idoso e residente em Trás-os-Montes? E, assumindo a duvidosa existência uniforme desses hábitos "nacionais", porque é que o comprometimento de respeito é apenas dos imigrantes em relação aos costumes dos espanhóis, e não dos espanhóis aos costumes dos imigrantes?
Lembro-me vagamente de ver, não sei se numa publicidade, ao vivo, num filme - a memória é imprecisa, mas as imagens que cria perduram - uma criança de dois ou três anos a abraçar um globo terrestre, mais ou menos do seu tamanho, com as duas mãos em lugares opostos do mundo e um sorriso nos lábios. O sentido da solidariedade, da integração, da partilha da essência da condição humana, são simples e totais como esse abraço. Pena que alguns, em vez da unidade na diversidade, continuem a apregoar a crispação da xenofobia.

4 comentários:

Unknown disse...

Querido David!! Que bom o exemplo do teu engagement. Há esperança, after all.
Um abraço fraterno,
Elsa Peralta

PS.: Quanto ao teu artigo, penso que focaste a questão fundamental, não apenas das eleições espanholas, mas também da Europa que queremos construir. Sou suspeita devido à minha formação, mas essa questão é, sobretudo, uma questão cultural. Nesse particular a Espanha do agora revela-se paradigmática.

marcos disse...

Meu caro David,
Como te disse quando falámos esta tarde, gostei mais do texto na forma de post. Deve ser o tom, ou então o facto de o post ser mais espontâneo, ou ainda a cadência e o encadeamento das frases... Seja como for, gostei muito e sabes que partilho todas as ideias que apresentaste. E admiro a coragem que tens em defender aquilo em que acreditas, especialmente se isso implica mandar recadinhos para dentro do partido de que fazes parte...

Pd. O "gume do tempo" não é sempre cruel; às vezes é bem generoso. Mais dois anos de ditadura e não teria o privilégio de te ter ao pé.

David Erlich disse...

Obrigado Professora! Hoje ver-se-á se a Espanha continua paradigmática ou se volta às trevas de um líder que considera o diálogo de civilizaçoes coisa meramente acessória.

Mais uma vez obrigado,

Um abraço também fraterno :)

David Erlich disse...

Caro Professor e Amigo Marcos,

O PS é um partido verdadeiramente pluralista em que é legítimo e recomendável haver diversidade de opinioes sobre um dado tema.

Quanto ao resto, o Professor já sabe...

Volto a dar-lhe os "duplos" parabéns ;)

Um forte abraço